Como descreves a tua relação com os videojogos?
Grande parte do meu dia é passado como crítico de videojogos. Não só meu site Rubber Chicken, que é independente, como com a coluna de videojogos que tenho no Observador. Nestes 7 anos em que escrevo sobre videojogos, sinto que, cada vez mais, parte do meu dia de trabalho passa por procurar jogos fora do espectro mainstream, ou seja, títulos sem representatividade mediática, fazendo quase um exercício de curadoria. Em muitos casos, são pequenas pérolas que mais ninguém conhece, de alguma forma. Antigamente, saiam 8 jogos por semana, agora saem 400. É difícil conseguir peneirar tanta oferta. Por essa razão, penso que os consumidores devem encontrar vozes que os ajudem nas suas escolhas.

E em que contexto nasce o Indie X?
O protótipo do Indie X foi feito em 2015, numa banca do Rubber Chicken, no Lisboa Games Week. Construímos um pequeno stand, com cinco postos de jogos que tínhamos conhecido e que queríamos mostrar ao público português. A recetividade foi muito boa e, em 2016, criámos o Indie Dome – o projeto anterior ao Indie X. Como tínhamos muitas editoras a virem ao Lisboa Games Week, havia muitas já com alguma dimensão (como a Square Enix) que cumpriram algo que era a nossa intenção: proporcionar um contacto com os developers portugueses. Este é o primeiro grande evento em que não tens os indies num canto ou no último pavilhão da feira, mas sim à frente. Isso tornou-se quase num porta-estandarte do evento. Este ano quisemos dar um passo em frente: O melhor jogo do evento vai receber 5 mil euros, que é um valor muito considerável. O único prémio a nível ibérico é o da Playstation, no valor de 10 mil euros. No futuro, queremos um prémio só para portugueses, para ajudar ao desenvolvimento.

Como foi o processo de seleção para o concurso?
Foi uma surpresa. Devemos ter cerca de 200 candidatos do mundo todo. Infelizmente, não vão estar todos representados pois a qualidade foi muito alta. Este foi o ano em que foi mais difícil escolher 25 jogos. Há muitos jogos muito bons que gostaríamos de apresentar ao público, mas não temos espaço.

Estes eventos são importantes dar visibilidade aos jogos indie?
Sim. No mercado dev [de desenvolvimento] português, há poucas empresas sólidas. O que há mais são pequenos estúdios indie que, infelizmente, mais cedo ou mais tarde, vão extinguir-se. É importante unificar a produção nacional, cuja qualidade tem aumentado muito ao longo dos anos, devido à democratização dos meios e às melhores ferramentas. Atualmente, há bons jogos feitos em Portugal. E é bom criar essa interligação entre developers nacionais e estrangeiros. Queremos que o Indie X seja esse grande momento anual de contacto da comunidade com o grande público. A nossa ambição que é o Indie X e o Lisboa Games Week sejam uma referência no panorama internacional.

O que é que a oferta indie acrescenta ao universo dos videojogos?
Nós fazemos militância indie porque acreditamos que há uma margem de risco nesse mercado que, por razões óbvias, o mercado mainstream não pode correr. O investimento próprio ou de menor volume dá-te margem criativa para testar e fazer coisas novas. Há uma maior experimentação artística. Fico embasbacado com produções mainstream. Mas surpreendido só fico com jogos indie. Porque só eles me mostram coisas que não estava à espera. Isso é grande parte daquilo que nos motiva a continuar este trabalho.

Essa liberdade e a inovação são importantes para "fugir" às tendências mainstream?
Sim. Porque, mesmo no substrato indie, quase se consegue ver quais são as trends. Se um jogo tem sucesso na esfera indie, passados uns meses vão surgir vários jogos a tentar beber daquela influência. Há casos de sucesso de jogos indie que depois têm repercussões no mercado mainstream: coisas tão inovadoras que conseguem chegar a um patamar superior de produção. O Minecraft começou como um jogo indie e acabou com uma venda milionária à Microsoft. Os jogos indie são quase um barómetro: se aquilo funcionou, então é uma boa ideia que vamos tentar aplicar.

E qual o grau de conhecimento destes jogos por parte do público?
Para além dos jogos que são incontornáveis, há uma grande fatia de jogos que deveriam ser conhecidos. No mercado indie, há alguns criadores que são ingénuos e até irrealistas mas há também uma margem de criadores com uma ideia e um conceito muito forte no qual apostam. Claro que há limitações técnicas óbvias, mas os melhores exemplos de bons jogos conseguem fazer dessas limitações também a sua própria linguagem. Os bons jogos indie não mascaram as suas limitações e estas acabam por ser úteis para se demarcarem. Nos últimos 6 anos, as ferramentas ficaram muito democratizadas e começamos a ver produções que, não estando ao nível dos blockbusters, facilmente rivalizam com eles. O que é bom é bom, ponto final.

 

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